quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Quali e quanti, "unidos para sempre"

A exposição de hoje tinha por objetivo convencer-lhes de que não há dois mundos, o da pesquisa quantitativa e o da pesquisa qualitativa. A tese doutoral da que falei hoje utiliza todas as ferramentas necessárias para chegar a seu objetivo: analisar as representações sociais sobre a Amazonia existentes em dois momentos da história de Brasil. Tudo isso inserido em uma teoria (teoria da mediação social da comunicação), que permite partir de técnicas reconhecidas (“análises das representações do relato” e dentro dessa técnica se há utilizado o “modelo canónico para a análise da mediação cognitiva”) e de conceitos aceitados.
A partir desses conceitos, e inseridos em a teoria, podem-se desenvolver novos conceitos (como o do mitologema). E graças a que se APLICA a teoria esta pode ser corrigida ou refinada (as teorias se não podem ser aplicadas não deveriam ter esse nome).
E a partir do uso de técnicas já utilizadas se podem propor novas técnicas.

As técnicas utilizadas em essa tese foram: a mostra estatística, a análise de conteúdo (de tipo estrutural e de participação), a utilização de estatística inferencial, a interpretação das inferências estatísticas mediante a pesquisa bibliográfica relativa ao período estudado, a pesquisa bibliográfica sobre mitos, a hermenêutica dos textos, a teoria de juízes, técnicas estructuralistas de análises de mitos, técnicas de análise lógica, técnicas de estatística multivariable (escalamento multidimensional e análise de componentes principais) e representações gráficas.

Anexo a Datashow da tese da Doutora Grace Stefanello: Análisis de los relatos de la prensa brasileña sobre la amazonía en dictadura y democracia.

Aquim o Datashow duma "ponencia" apresentada na ALAIC 2006 por Douctora Grace Stefanello e eu.
Artigo Metodología de identificación de mitos y representaciones en Medios de Comunicación, Grace Stefanello e Alberto de Francisco.


Vou fazer uma breve reflexão...

Antes de existir a medida a humanidade avançou, acredito. Quando se acabavam os dedos da mão para contar ovelhas podias levar uma bolsa cheia de tantas pedras como ovelhas tivesses. Para medir distâncias se utilizavam os passos: era uma medida muito pessoal, mas mais ou menos homogênea. Mas pôr de acordo a duas pessoas sobre quantos passos tinha entre uma cidade e outra era impossível.

O tempo se media em dias, em luas e em anos. Graças a que se aperfeiçoou a medida do tempo avançou a agricultura e mais tarde a navegação pela mar.

E graças a que se aperfeiçoou a medida dos fenômenos físicos avançou a ciência.

Renunciar a priori à medida em ciências sociais ou humanas é um erro. Reconhecer sua dificuldade, não. Critiquemos uma medida concreta de um fenômeno social, não o conceito de medida. Qualquer medida pode ser aperfeiçoada, mas nenhuma medida não é a solução.

Confiar exclusivamente em a medida também é um erro. Para isso são necessárias a teorias. As teorias explicam, as medidas não. Mas as teorias explicam a realidade. E a única maneira de que a realidade não seja uma construção subjetiva para cada uma das pessoas é medí-la.

O quantitativo é medição, lembrem.

9 comentários:

Katrine disse...

Oi, gente!
Primeiro, o seminário é realmente restrito aos inscritos. Portanto, se alguém tiver interesse, é melhor procurar a Regina na secretaria do PPG e fazer a inscrição. Eu não sei como postar o link com o arquivo do word. Então, quem quiser receber, me mande um e-mail: katrinetb@yahoo.com.br.

Sobre a aula, eu concordo que não é útil essa divisão entre pesquisa quantitativa, qualitativa, quantiqualitativa e blá blá. Acho que ficar rotulando as coisas não ajuda em nada. Inclusive, uma coisa que achei interessante foi pensar que a não existência de paradigmas reconhecidos por todos os pesquisadores em Comunicação dificulta o avanço da área. Penso que isso pode ser uma das razões sim. Vai ver é por falta desses paradigmas e de gente preocupada em desenvolvê-los que temos tantas propostas de inter/trans/multidisciplinaridade, apenas para omitir o real problema... Enfim, só para concluir: tive um insight durante a aula. No meu último comentário, disse que não conseguia visualizar a utilização de técnicas quantitativas na minha pesquisa. Mas aí pensei hoje que a análise bibliométrica pode me ajudar muito. Isso é ruim do ponto de vista não científico, porque acho que essa técnica é muito chatinha de ser utilizada... :)
Mas, na verdade, é muito bom, pois marca o desenvolvimento metodológico de minha pesquisa. De repente, meu objeto de pesquisa realmente me mostrou a necessidade da utilização de uma determinada técnica, independente do meu gosto/vontade de usá-la. E uma técnica quantitativa!
Até a próxima!

Anônimo disse...

Olá!
Eu também estou abrindo meus olhos para o uso dessas técnicas, da mesma forma que Katrine. O mais difícil é a gente se liberar das amarras narrativas e da aversão aos números. Não vejo também como uma análise quantitativa não seja qualitativa, afinal, os dados precisam ser refletidos, discutidos, analisados, contextualizados. Trabalharei com estatísticas simples e gráficos que darão um panorama necessário á análise da participação e contextualização dos programas de televisão regionais e locais no Brasil. O meu problema agora é usar tais ferramentas, pois sou completamente leiga nisso.
Verônica Dantas

Unknown disse...

Tenho solidificado meu conceito de que é importante para nós, quase-cientistas sociais, abrirmos espaço para a parte quantitativa das pesquisas, sem preconceitos. Foi muito útil, na aula de ontem, mostrar uma tese onde os números foram aplicados, e visualizar, na prática, que números, por si só, não explicam tudo (parece óbvio, mas a mídia, por exemplo, tenta nos convencer do contrário o tempo todo, com pesquisas de opinião pública divulgadas como se fossem verdades universais).
Uma parte do conteúdo da aula que me chamou a atenção foi a pesquisa exploratória, necessária para a criação de categorias com que se vai trabalhar. É desesperador, para um pesquisador, saber que, há possibilidade de, no meio do trabalho, ter que voltar ao início depois de perceber uma recorrência importante nos dados que não fazia parte das categorias escolhidas inicialmente. Mas são as regras do jogo, e, ao mesmo tempo que dá mais trabalho, torna a pesquisa mais desafiadora.

Unknown disse...

Gostei da reflexão, Alberto.

Vou na linha da Katrine: não vale a pena tentar hierarquizar processos quantitativos e qualitativos. Até porque essas decisões, acredito, não fazem parte da instância metodológica. Estão mais para a instância metódica.

Acredito que o rigor metodológico vai apontar os caminhos, ora qualitativos, ora quantitativos. É uma boa definição do problema de pesquisa e o entedimento adequado da problemática que vai apontar os caminhos. Acho que uma abordagem científica, garantida a autonomia da pesquisa (Abraham Kaplan), acaba levando ao caminho certo.
Preciso medir? Devo comparar? Devo me aprofundar em material teórico?

De quaquer modo, acho interessante ficarmos atentos para possibilidades de medições em nossas pesquisas. Em muitos casos, pode ser um elemento importante, embora não em todos.

Anônimo disse...

Prezados,

Sobre a utilização de metodologias quantitativas ou qualitativas, agora que temos mais informações sobre a aplicação dessas metodologias, ainda acho que o mais importante é a definição do objeto de estudo. Simples como isso. Quanto mais preciso for esse objeto, mais claro ficará o quê, exatamente, se quer conhecer ou medir nele (no sentido mais detalhado dentro do universo a ser pesquisado).
Não é nada agradável admitir, mas estou com a Verônica quando ela diz que a dificuldade está, ainda, em manejar os instrumentos de trabalho, as estatísticas e os gráficos... Além desses assuntos não fazerem parte de nossa formação de jornalistas (pelo menos no meu tempo...), eu não tive a paciência de estudá-los por minha conta nos últimos (muitos) anos de minha vida profissional. Embora há tempos tenha sentido essa necessidade para separar o joio do trigo - e ficar com o trigo! - na enxurrada de informações que os jornais despejam diariamente em nossas cabeças e que precisamos questionar a todo instante. Enfim, agora é correr atrás e estudar...

Para o meu objeto de estudo, tenho encontrado muito apoio nas pesquisas da ANDI (quem não conhece deveria conhecer, www.andi.org.br) e, como eles já fizeram vários estudos na mesma linha que o meu projeto, pretendo usar parte da metodologia deles, incluindo a categorização de variáveis entre outros elementos. Por compreender agora a real importância da metodologia na pesquisa, fiz contato com o especialista da ANDI e dei mais alguns passos para meu projeto.
Acho que estou avançando muito com a ajuda desta matéria. Abraço,

Bárbara de Velasco disse...

Acredito que agora não temos mais como fugir: não existe possibilidade de separar uma pesquisa quantitativa de uma qualitativa e vice-versa. Isso apenas nos dá a garantia de uma maior proximidade com a "realidade".
Gostaria também de expor meu contento quanto a tarefa requerida pelo Professor. Poderemos agora entrar em contato com algumas técnicas de pesquisa e de exposição dos dados. Tenho certeza de que será uma experiência bastante proveitosa!

Juliano Basile disse...

Professor, queria deixar aqui uma “provocação”, algo que venho pensando durante suas aulas sobre este ato de medir. Acho importantíssimo que nos alerte para isto e para as “poucas” medições nos estudos brasileiros de comunicação. (Abro aspas porque não sei se são mesmo poucas.) Medir é essencial, mesmo que fique para registro, conforme vc nos disse na última aula. Mesmo que não provemos nada, ficará o registro para futuros pesquisadores.
Mas, no jornalismo, estamos medindo aspectos extremamente subjetivos. Se medirmos as capas de revista para verificar quantas trataram de desigualdade, teremos apenas um indício, e não uma comprovação de que esta revista (Veja, Carta Capital, qualquer uma...) não elegeu este assunto em suas capas. Não significa necessariamente que a revista não trate do assunto. Ela pode tratar de seu modo: progressista, conservador, de direita ou de esquerda. O que quero dizer é que as notícias são decididas dentro dos jornais por processos extremamente efêmeros. Fatos atropelam capas de revista, sejam de direção ideológica ou não. É claro que há direcionamentos e órgãos de imprensa mais “liberais”, de oposição ou mais governistas. Mas, há capas que são acidentes, manchetes que não foram programadas pelas chefias, muito menos pelo dono do jornal. Há capas programadas que são literalmente atropeladas pelos fatos. Um exemplo: No Pan, os jornais já tinham prontas as suas capas sobre a recuperação de Jade Barbosa (choro num dia e medalha no outro). Mas, a capa do dia seguinte foi a do acidente da TAM. A Jade nem apareceu nas capas, claro. Outro exemplo: A Globo deu a imagem (que ela fez) do Marco Aurélio Garcia comemorando notícia que livrava a culpa do governo do acidente depois que os sites e blogs publicaram que a imagem existia. Será que teria dado se não houvesse a notícia na internet? O que quero dizer é que os processos de produção de notícias são tortuosos e ao medirmos o produto final não necessariamente temos um quadro das intenções deste meio de comunicação. Podemos aferir tendências (o que é importante, claro), mas não sei se provaríamos direcionamentos dos meios. Acho que ficaríamos mais com o ponto de vista dos leitores. De quanto chega a eles sobre desigualdade. O que é, de todo modo, muito importante. Enfim, fica essa reflexão para eventual debate.

Alberto de Francisco disse...

Os pesquisadores, de maneira inconsciente, utilizam um destes paradigmas:
-A verdade científica se atinge por revelação, de uma só vez.
-A verdade científica se atinge por acumulação, por soma de fragmentos.

Por outra parte aqui tendes outra provocação: um pouco de informação de um fenômeno (ainda que seja parcial), é melhor ou pior do que nenhuma?

Se tua mente científica utiliza o segundo paradigma, é melhor ter informação parcial, por escassa que seja, sempre que se corresponde a "algo" da realidade.

Mas se tua mente científica utiliza o primeiro paradigma não será assim... Pouca informação nos pode induzir a erro, pode-nos desviar do entendimento completo da realidade. Por isso é melhor não ter dados parciais da realidade, porque podem ser equívocos. E os dados, sempre som parciais...

Eu utilizo o segundo paradigma. Se utilizais o primeiro paradigma, nunca vereis úteis as medições, pois por definição uma medição só mede um aspecto da realidade.

Mas... o segundo paradigma, até o momento, resultou ser mais eficaz do que o primeiro :-)

Unknown disse...

Sobre o comentário do Juliano,

não acho que esse método "ocasional" de eleger manchetes (apenas como exemplo) influencie em uma amostra estatística. Até porque a estatística é uma técnica que trabalha com médias e incidências exatamente para eliminar os casos de desvio muito grandes.

Em uma amostra grande, será possível, entre outras coisas, indentificar até um ciclo de ocorrência de "manchetes ocasionais" -- entendendo como ocasionais aquelas que mudaram de última hora.